Alegando prejuízos acumulados com a recente disparada no preço dos insumos, concessionárias de rodovias e construtoras que executam obras públicas estão levando para o governo federal e para os Estados novos pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro dos seus contratos. A lista de aumentos com forte peso no caixa das empresas é encabeçada pelo cimento asfáltico de petróleo, um dos materiais mais usados em qualquer obra em estradas, que subiu quase 80% nos últimos 18 meses. Mas a alta se espalhou para itens como aço, tubos de PVC, ligantes betuminosos, madeira, cobre e óleo diesel.
As principais entidades empresariais do setor têm em mãos pesquisas e estudos recém concluídos para sustentar seus argumentos. Uma sondagem inédita da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), com mais de 200 empreiteiras de diferentes portes e regiões do país, detectou três pontos de atenção decorrentes da alta de in-sumos: impacto financeiro, ritmo de execução das obras e demissões.
De acordo com o levantamento, só 26% das construtoras conseguiram atravessar o período entre janeiro de 2021 e abril de 2022 sem cortes de pessoal. Dois terços (66,5%) afirmam ter diminuído as atividades nos canteiros e 11% chegaram a paralisar seus serviços. Pouco menos de metade (41,5%) relata prejuízo de até 40% nos contratos - déficit entre os valores recebidos de governos e os valores gastos na execução das obras públicas contratadas.
Para o presidente da Comissão de Infraestrutura da CBIC, Carlos Eduardo Lima Jorge, os aumentos “excessivos e imprevisíveis” nos preços de insumos tornam urgente uma repactuação dos contratos com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e os Estados.
A CBIC e a Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias (Aneor) protocolaram no Dnit um ofício pedindo formalmente, “em caráter de urgência”, uma solução para o desequilíbrio dos contratos. Elas defendem duas medidas: alteração do mês-base dos contratos e revisão na periodicidade dos reajustes. Nas estradas pedagiadas, as reclamações vão na mesma linha. A Associa-ção Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR) contratou um estudo da Tendências Consultoria Integrada para ilustrar a “imprevisibilidade” nas variações dos preços de insumos. Conclusão: há “descolamentos inesperados” dos padrões históricos, que decorrem de eventos alheios à oscilação dos indicadores econômicos, pelo me-nos desde 2015. As altas abrangem materiais como asfalto, aço galvanizado, cimento portland (usado para pavimento de concreto). Na apresentação do estudo verifica-se que, depois dos picos registrados em cada período, não há volta para os patamares anteriores.
O presidente da ABCR, Marco Aurélio Barcelos, avalia que os contratos de concessão exigem reequilíbrio econômico-financeiro porque as tarifas de pedágio - nem agora e nem com os reajustes ordinários previstos (a maioria tendo o IPCA como indexador) - são incapazes de capturar esse aumento dos insumos e comprometem o fluxo de caixa. “Mecanismos contratuais servem para condições normais de temperatura e pressão, mas hoje há um descolamento brutal entre o preço de certos insumos e os índices inflacionários. É um período extraordinário”, diz Barcelos.
Entre o fim de maio e o início de junho, segundo ele, a associação levará à Agência Nacional de Transportes Terres-tres (ANTT) a “fundamentação jurídica” para embasar um pedido geral de reequilíbrio. Uma vez reconhecida a tese e adotado o mecanismo, cada concessionária se incumbiria de apresentar sua própria solicitação.
A agência reguladora e o Ministério da Infraestrutura, porém, ainda não se convenceram da necessidade de repactuar os contratos. “Estamos observando um desequilíbrio inflacionário, um desequilíbrio entre oferta e demanda, mas com sinais de que pode ser uma situação pontual”, afirma o diretor-geral da ANTT, Rafael Vitale, citando a guerra na Ucrânia como um dos possíveis fatores para a alta dos insumos.
Matéria Publicada Por Daniel Rittner e Rafael Bitencourt — De Brasília - Jornal Valor Econômico de 19.05.2022